Por Nazanín Armanian
“Apesar da conspiração entre
árabes e americanos para baratear o petróleo e pressionar economicamente a
Rússia, Irã e Venezuela, os preços voltam a subir.
Se ainda alguém não sabe, a “Aramco” – a empresa de petróleo da Arábia
Saudita, e também a maior do mundo –, até bem pouco tempo, em 1977, se
chamava “Arabian American Oil Co.”, sendo de propriedade comum entre a família
saudita e várias empresas da Califórnia e do Texas. Por isso, não se pode ficar
surpreso se a dupla Washington-Riad tiver algo a ver com a queda brusca dos
preços de 115 dólares o barril para 45 dólares entre junho e dezembro passados,
levando em conta que o mercado de petróleo não é “livre”: ele é controlado
por um cartel chamado OPEP e por grandes empresas petrolíferas ocidentais.
E mais, o combustível gorduroso e malcheiroso, antes de tudo, é uma arma que
nesse caso foi apontada contra a Rússia, o Irã e a Venezuela com a finalidade
de conseguir mudanças em suas políticas via afundamento de suas economias, e
ainda resgatar um falecido petrodólar – um dos pilares da hegemonia mundial
dos EUA.
No
entanto, a festa durou pouco e os promotores da “conspiração Aramco” se deram
conta de que os prejuízos dessa queda de preços são maiores do que seus
benefícios político-econômicos. Por isso, o preço de venda do petróleo para o
mês de março teve uma notável melhora nos três mercados de Brent, dos EUA e da
OPEN, oscilando por volta de 59 dólares o barril.
Aqui vão alguns motivos:
1.
Os membros dos BRICS, com exceção da Rússia, foram os principais agraciados
pela compra de um petróleo barato.
a)
China, o principal rival dos EUA e o segundo consumidor mundial de petróleo,
bateu seu recorde de importações de petróleo, apesar de seu crescimento
econômico ter sido o mais frouxo desde 1990 (mas registrou, no primeiro
trimestre de 2014, um crescimento de 7,2%): começou a comprar 6,2 milhões
de barris por dia, e acabou o mês de dezembro com 7,2 milhões de barris por
dia, injetando-os em sua “Reserva Estratégica de Petróleo” (o armazenamento
ocorre para afrontar as emergências, como a interrupção do abastecimento).
Com isso, a China não só deixou os EUA nervosos, mas contribuiu para empurrar
os preços para o alto, por dois outros fatores: tirar boa parte do excedente
de petróleo que nadava no mercado e gerar incerteza sobre seu passo seguinte no
mercado.
b)
Beneficiou o Brasil, a principal potência rival dos EUA na América, e que agora
está decidida a recuperar sua influência no seu “quintal”, e a África do Sul, o
principal competidor de Washington na África. Os BRICS decidiram abandonar o
dólar em suas transações e criaram um banco com a finalidade de debilitar as
instituições financeiras ocidentais.
2. Não conseguir mudar a postura de Moscou nos casos da Ucrânia, Crimeia e
Síria. Pois se os setores belicistas ocidentais desferiram o primeiro ataque à
Rússia, provocando um golpe de Estado na Ucrânia, levando à surpresa da
integração da Crimeia à Federação Russa, eles pensaram que uma drástica queda
nos preços do petróleo – triturando o rublo e a economia russa – fosse
provocar a rendição do Kremlin. Estratégia ruim, já que o golpe à economia do
país eslavo, assim como a dramática guerra da Ucrânia, deixou cerca de 6 mil
mortos e milhões de desabrigados, e teve efeito negativo sobre os países
europeus aliados de Washington, que enfrentam ameaça de recessão: estão
perdendo o mercado russo e também os investimentos, tanto dos magnatas russos
como de seu Estado. Na Espanha, por exemplo, os milionários russos estavam
comprando prédios inteiros herdados da era da especulação mobiliária. Além
disso, é incompreensível que não previssem uma aproximação Moscou-Pequim (sem
precedentes após a morte de Stalin) e Moscou-Teerã: os presidentes Vladimir
Putin e Hassan Rouhani, que compartilham o sofrimento pelas sanções impostas
pelos EUA e seus sócios, assim como pela “Conspiração Aramco”, tiveram quatro
encontros em um ano, algo também sem precedentes na história dos dois vizinhos.
3.
Quanto ao Irã, não conseguiram pressioná-lo para conseguir mais vantagem nas
negociações nucleares em curso e subtrair suas forças na região porque:
a)
Teerã não deixou de apoiar o governo de Bashar al-Assad (a Síria representa
a profundidade estratégica do Irã enquanto ele, Bashar al-Assad, está no
poder), e inclusive já fala abertamente dos generais iranianos que
trabalham em solo sírio;
b) nem aceitou o fechamento total de seu programa nuclear, e isso apesar de John Kerry ter lançado um ultimato a Teerã para assinar um acordo político global até o final de março – se não, não retomariam as negociações. O certo é que a administração Obama está muito consciente da luta pelo poder no seio da República Islâmica entre os setores militares – contrários a um acordo com os EUA – e o governo do presidente Rouhani, que tenta, por um lado, driblar as sanções que estão afogando a economia iraniana e, por outro, evitar um confronto bélico (tentou baixar a tensão depois que o míssil israelense matou um general iraniano na Síria, no último dia 20 de janeiro). Se Obama pretende impedir um Irã nuclear, um petróleo com preços no chão, aumentará a tensão social em um Irã monoprodutor e fortalecerá a posição dos céticos e dos setores que querem guerra (assim como EUA e Israel). As medidas de Rouhani diante da manobra da “Aramco” foram incentivar a exportação dos produtos não petrolíferos, investir no turismo, aumentar os impostos, manter os subsídios aos principais produtos de consumo e a ajuda às famílias desfavorecidas, além de uma política externa agressiva na região com um ramo de oliveira nas mãos – que inclui sobretudo os países árabes “inimigos” e membros da OPEP, como Kuwait ou Catar.
4. A
perda de centenas de milhões de dólares por parte das grandes empresas
petrolíferas ocidentais, como as que operam no Iraque, Líbia, Nigéria, entre
outros.
5. O
déficit orçamentário gerado pela queda do preço do petróleo criou dificuldades
para os xeiques sauditas, em pelo menos estes três cenários:
a)
No interior do país: seus orçamentos foram elaborados com base no barril de 72
dólares, e agora se enfrenta aumento importante dos preços dos produtos
básicos. Além disso, previu-se, desde a repressão da primavera de 2011,
realizar uma série de projetos que melhorariam a vida dos cidadãos – como a
construção de moradias, a criação de postos de trabalho, ou a chegada de água e
luz a milhões de pessoas que vivem na pobreza absoluta – e que agora estão
paralisados.
b)
No Egito: a promessa feita em 2011 aos militares encabeçados pelo general
Al-Sisi de receber 160 bilhões de dólares anuais, acabaram com a Irmandade
Muçulmana do presidente Mohammed Mursi, preso após o golpe de Estado. O que
acontecerá no Egito, seu grande aliado contra Irã, se não cumprir?
c)
No Iraque e na Síria: dificuldade para pagar os honorários de milhares de
jihadistas do Estado Islâmicos e grupos parecidos, cuja missão é acabar com os
governos de Damasco e de Bagdá, ambos próximos a Teerã, e arrastar o Irã para
uma guerra regional sectária. Desde 2011 até hoje, investiu bilhões de dólares
nesses terroristas, com êxito parcial: destruiu o Estado sírio, mas ainda
não conseguiu levantar um novo e afim.
6.
Nos EUA, dois fatos contribuíram para o aumento dos preços do barril:
a)
Os cortes nos investimentos de capital por parte das multinacionais na extração
do petróleo de xisto como resposta à queda dos preços. Pois cada barril lhes
está custando entre 70 e 80 dólares (diante dos 15-20 dólares no Oriente Médio)
e um petróleo por menos desse preço, obviamente, não é rentável. Com isso, nos
EUA e no Canadá, cerca de 90 plataformas de exploração fecharam. BP perdeu
bilhões de dólares em todo o mundo e planeja reduzir suas atividades de
exploração à metade e os investimentos até 20%. A Chevron está em situação
parecida.
b) A
greve de cerca de 4 mil trabalhadores das empresas Royal Dutch Shell Oil e BP
em nove refinarias em Ohio, Califórnia, Kentucky, Texas e Washington, iniciada
em 1° de fevereiro. Exigem um convênio coletivo para o setor, a redução do
número de trabalhadores não sindicalizados e melhorias nas condições de
segurança e saúde, em uma greve que é a primeira dessa envergadura há várias
décadas.
7. O
aumento da tensão na Líbia e a perda de 800 mil barris em um incêndio.
8. O
perigo de instabilidade social em países aliados aos EUA, como Iraque
(incluindo seu Curdistão) ou Nigéria, pela queda dos petropreços.
O
único e grande triunfo dos EUA e da Arábia Saudita nessa história até o momento
foi transformar a OPEP em espectro do que foi entre 1960 e 1990, e não apenas
porque sua cota de mercado caiu de 62% para os 30% de hoje, mas porque a
Arábia, o Kuwait e os Emirados Árabes Unidos fizeram uma frente contra pesos
pesados da organização, tais como Irã, Iraque, Argélia, Venezuela e Equador.
Os
preços do petróleo tocaram fundo. É perfeitamente lógico que o “Naft” (seu
nome em persa, e do qual vêm palavras como “naftalina”) não apenas recupere
seu preço – que hoje é mais barato do que uma garrafa de bom vinho –,
mas também seu valor: é o resultado de milhões de anos do esforço “não
renovável” da natureza.”
FONTE:
escrito por Nazanín Armanian no portal “Carta Maior”
(http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/8-razoes-pelas-quais-o-preco-do-petroleo-esta-voltando-a-subir/7/32866).
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