Lisboa - Começou em Lisboa o julgamento de
Maria Eugénia Neto. A viúva do ex-presidente angolano Agostinho Neto é acusada
de difamação, por chamar "desonesta e mentirosa" à coautora do livro
"Purga em Angola", Dalila Mateus.
Fonte: DW
O Tribunal Criminal de Lisboa, no Campus da Justiça, é
o palco do julgamento de Maria Eugénia Neto, acusada de difamação pelas
declarações que esta fez numa entrevista concedida à revista "Única"
e publicada no jornal português Expresso de 5 de janeiro de 2008.
A queixa-crime apresentada pela investigadora Dalila
Cabrita Mateus contra a viúva do primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto,
resulta das afirmações da arguida, que nessa entrevista qualificou a
historiadora portuguesa de "desonesta e mentirosa".
Dalila Mateus, coautora do livro "Purga em
Angola", publicado em 2007, sentiu-se seriamente ofendida depois de ler na
referida entrevista a resposta de Eugénia Neto à questão colocada por dois
jornalistas do Expresso a propósito das anunciadas 30 mil mortes resultantes do
27 de Maio.
Esta data tem a ver com os acontecimentos ocorridos em
1977 e nos anos seguintes à contestação interna liderada por Nito Alves contra
o rumo que então seguia o Movimento Popular de Libertação de Angola, o MPLA.
Difamação?
À DW África, Miguel Faria de Bastos, advogado de
defesa da arguida, explicou que, neste processo, o que está em causa é
"saber se o comentário [de Maria Eugénia Neto] tem caráter
difamatório." Ou seja, se efetivamente, não dignifica a autora do livro
"Purga em Angola", referiu.
Será este o mote do julgamento que decorre até o dia
13 de março. Na primeira sessão desta quarta-feira (27.02.2013), dirigida pela
juíza Ana Paula Figueiredo, foram ouvidos a lesada Dalila Mateus, bem como o
jornalista José Pedro Castanheira, que conduziu a entrevista exclusiva com a
colega Cândida Pinto.
No final da audiência, o advogado da queixosa, Sérgio
Braz, preferiu não prestar declarações até que esteja concluído o julgamento.
Numa reação prévia a um e-mail endereçado pela DW África, Dalila Mateus apenas
manifestou confiança na justiça portuguesa e na independência do poder
judicial.
Pesquisa intensiva
Entrevistada pela DW África em maio do ano passado, a
propósito dos acontecimentos de 27 de maio de 1977, a investigadora explicou
ter começado a fazer entrevistas a antigos presos políticos devido à sua tese
de doutoramento.
Ouvi presos de Angola, de Moçambique, da Guiné que me
contaram todas as torturas infligidas pela PIDE", a polícia política da
ditadura portuguesa. "Depois, para o livro sobre o 27 de maio ouvi os presos
angolanos narrar tudo aquilo que sofreram nas cadeias." Muita documentação
que sustenta o trabalho da pesquisadora, as gravações e as transcrições de
todas as entrevistas, está depositada no Arquivo Nacional da Torre do Tombo,
acrescentou Dalila Mateus.
O livro "Purga em Angola" escrito em
parceria com o marido Álvaro Mateus, que já vai na oitava edição, é resultado
de uma aturada pesquisa para a sua tese de doutoramento. No tribunal, a
historiadora sustentou que as declarações da viúva de Agostinho Neto põem em
causa todo o seu trabalho de investigação.
O julgamento prossegue esta quinta e sexta-feira (28 e
29 de fevereiro) para audição de outras testemunhas arroladas pela queixosa,
entre os quais o historiador Fernando Rosas. O ex-presidente da República
Portuguesa, Ramalho Eanes, uma das testemunhas da defesa, deve prestar
depoimento por escrito.
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